quarta-feira, 2 de maio de 2012

DE SALÁRIOS E COMPETITIVIDADE



No seu habitual artigo das Terças-Feiras no JN, referia-se ontem o meu amigo Alberto Castro a um relatório do Eurostat – dizendo que os custos por hora de trabalho eram, em Portugal, menos de metade da média da Zona Euro e pouco mais de um terço dos alemães – e a uma afirmação de Vítor Gaspar – dizendo que a redução em curso dos nossos custos de trabalho, somada às reformas estruturais, permitiria estimular a competitividade internacional dos sectores que produzem bens transacionáveis – para evidenciar que “a crer no discurso do Governo, na versão Gaspar, a descida dos salários mais as reformas estruturais seriam a panaceia”. Mas, e numa muito pertinente perspetiva diversa, acrescentava também que “sem uma transformação radical da nossa especialização produtiva, não há descidas salariais que nos valham”.

Abaixo junto três gráficos que elaborei com base nos ditos dados do Eurostat (“Labour Costs in the EU 27 in 2011”, nota de imprensa de 24 de Abril) no sentido de ajudar a estabelecer um ponto de situação estruturado sobre a matéria. O primeiro mostra o enorme diferencial existente entre os níveis remuneratórios horários médios vigentes no conjunto dos Estados membros (entre um mínimo de 3,5€ na Bulgária e um máximo de 39,3€ na Bélgica), além dos diferentes graus de pressões salariais verificadas no período pós-crise (desde 2008) e da posição relativa dos vários países (ambos os aspetos deixando em aberto inúmeros filões possíveis de análise).

Focando apenas o caso português, sublinhe-se que o facto de ainda existirem dez países detendo custos de trabalho inferiores aos nossos indicia com clareza até quanto ainda poderíamos (poderemos?) vir a estar sujeitos a lógicas tecnocráticas e empobrecedoras oficialmente tidas por virtuosas mas – também devido a uma concorrência em baixa com economias dotadas de maior margem de manobra por não pertencerem à Zona Euro, como é o caso de sete daquelas dez – competitivamente inconsequentes.





O segundo e terceiro gráficos, ao mesmo tempo que hierarquizam os níveis salariais dos países para o mais recente ano disponível (2011) – colocando-os por ordem decrescente através, respetivamente, de uma recondução à base 100 dos 27 parceiros comunitários (EU27) ou dos 17 membros da Zona Euro (EA17) – e assim tornam mais percetíveis as comparações entre eles, permitem também consolidar o verdadeiro alcance do que acima é sublinhado. Sobretudo na medida em que fazem ressaltar o logro em que vamos vivendo, designadamente quanto à larga inoperância de uma aposta em baixar salários numa “economia cercada no comércio internacional” (recorrendo à expressão usada por José Félix Ribeiro em diversos trabalhos de cenarização realizados no quadro do DPP, ver esquema) – nem dá para competir com a China (ou com a Bulgária, a Roménia, a Polónia, a Hungria ou a República Checa) nem dá para fazer face à qualidade da Alemanha (ou até da Itália).

Alberto Castro tem razão, pois: “Para induzir a transformação necessária, as reformas estruturais não são incentivo suficiente nem o mercado, só por si, nos levará lá. Precisamos de uma política económica activa, com uma visão cosmopolita que estimule a melhoria e a mudança.” E o “cartoon” de António (“Expresso”), reproduzido a abrir este post (amarrados, às mãos de Gaspar e no meio da ponte), ilustra-o sinteticamente à perfeição…

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